• 10 de maio, 2024 06:56

Quatro anos sem justiça para Marielle e Anderson

ByDudu Correia

mar 14, 2022

Marielle Franco em agosto de 2016. Foto: Wikimedia Commons.

O 14 de março deste ano marca quatro anos desde que Marielle foi assassinada. São quatro anos em que a família teve que tirar forças para lutar por justiça e defender a sua memória. Após provas de interferências externas e diversas mudanças na condução da investigação, o caso de Marielle e Anderson chega a quatro anos sem respostas sobre quem mandou matar Marielle e por quê.

Diante disso, o Comitê Justiça por Marielle e Anderson, articulação das famílias de Marielle e Anderson com o Instituto Marielle Franco, o mandato da vereadora Monica Benício, e as organizações Anistia Internacional Brasil, Justiça Global, Coalizão Negra por Direitos e Terra de Direitos, entidades de direitos humanos de reconhecida atuação pública e nacional no tocante à defesa da memória, legado, sementes e da luta pela justiça por Marielle Franco, vêm realizando uma série de reuniões, neste mês de março, com autoridades responsáveis pela resolução do caso.

O crime que chocou o mundo retratou o extremo a que a violência política contra mulheres negras pode chegar. O assassinato de Marielle Franco trouxe luz às estruturas que circundam a vida política das mulheres negras da sociedade e expôs as rachaduras estruturais presentes na frágil democracia brasileira. Sendo assim, na última terça-feira (8/3), nós do Comitê nos reunimos com o juiz responsável pelo caso. Na quarta (9/3), foi a vez de nos reunirmos com o quinto delegado à frente do caso para entendermos o porquê de mais uma troca. Na quinta (10/3) nos reunimos com o ministro Rogerio Schietti, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Diante da decisão de pronúncia, a defesa interpôs Recurso em Sentido Estrito perante o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), o qual foi desprovido. Diante disso, a defesa de Ronnie interpôs um Recurso Especial para o STJ, o qual não foi conhecido. Após isso, a defesa de Ronnie interpôs o Agravo em Recurso Especial: Aresp nº 1927054 / RJ (2021/0219473-9), do qual é relator o ministro Rogerio Schietti, que recebeu as famílias e o referido comitê.

Nesta segunda-feira (14/3), o Comitê Justiça por Marielle e Anderson se reunirá com o Ministério Público do Rio de Janeiro para falar sobre a investigação. Por sua vez, até a conclusão deste texto, o governador do Rio de Janeiro não havia respondido à solicitação de reunião do comitê.

Para mais, a impunidade em casos de violações a direitos humanos no Brasil foi identificada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos em sua última visita ao país, em 2021. Os advogados da família até hoje não têm acesso aos autos da investigação sobre os mandantes. A partir da análise dos desdobramentos de vários casos relevantes de violência contra defensores de direitos humanos em todo mundo, é possível perceber que uma das formas de impedir a impunidade é justamente garantir acesso da família à investigação.

As famílias, na verdade, são o elo de continuidade da investigação: podem trocar delegado, promotor, mas a família da vítima seguirá sendo a mesma. Quanto à obrigação do Estado de permitir aos familiares das vítimas participarem de maneira formal e efetiva da investigação conduzida pela polícia ou pelo Ministério Público, o que foi reconhecido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos quando da condenação do Estado brasileiro no caso da Favela Nova Brasília, o CNJ emitiu a Resolução 253/2018 e a Resolução 386/2021, adotando a orientação técnica que explicita os direitos da vítima de participar de todas as etapas da apuração de responsabilidade dos autores de crimes relacionados a direitos humanos, incluídas a etapa investigatória e a fase de conhecimento.

Tal direito, também reconhecido na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), constitui acesso à justiça, garantia cuja violação ocasionou condenação do Brasil perante a CIDH mais de uma vez. Nesse sentido, a doutrina e jurisprudência constantes dos órgãos do Sistema Interamericano de Direitos Humanos determinam que o Estado tem o dever de investigar toda situação em que haja uma violação dos direitos humanos protegidos pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Ele decorre do dever geral de garantia previsto no artigo 1.1 da Convenção, bem como do direito à garantia judicial e à proteção judicial efetiva de seus direitos, previstas nos artigos 8º e 25 do mesmo instrumento. Com efeito, o direito das vítimas e de seus familiares a uma aplicação adequada de justiça em relação às violações dos direitos humanos decorre justamente das referidas normas convencionais.

Não importa quanto tempo passe. Continuaremos lutando por justiça. Por Marielle, por Anderson, por todas as defensoras de direitos humanos, por todas as mulheres negras, pelo povo preto, pela população LGBTQIA+, pela população favelada. É por isso que nós e milhões de pessoas continuamos a perguntar: quem mandou matar Marielle e por quê?

Publicado no site Jota

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