• 13 de maio, 2024 18:01

A cidade da fé é chão dos refugiados do clima. Por Íris Tavares

ByDudu Correia

fev 25, 2022

Por Íris Tavares – Historiadora e Escritora.    

A cena foi registrada numa manhã ensolarada de domingo. É certo que as calçadas ainda permaneciam úmidas dos sobejos e dos respingos da chuva madrugadora. Na mira orbital estavam a praça dos Franciscanos cercada pelo passeio das almas e outros equipamentos públicos instalados para atender as necessidades da municipalidade, dentre eles, a escola, o pronto socorro, a sede local do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial, uma edificação colada à quadra onde funcionava as instalações da antiga Usina Maria Amélia de beneficiamento do algodão e que por longos anos alimentou parte da demanda têxtil do estado, porém com as incessantes crises na economia passou a ser tutelada com as expensas do erário público.  Um exemplo singular da dominação do poder econômico com seus interesses parasitários a se sobrepor na política.

Voltamos a observar os arredores da praça e visualizamos a estação ferroviária que simboliza o ponto de partida e de chegada das pessoas. Ali avistamos o nosso hóspede de todos os tempos, envolto nos seus panos, molambos e mochilas que também lhes servem de amparo. Um pacote humano despejado na rua ou mesmo na calçada e/ou aboletado na entrada do local sagrado, do repositório da oração que acende a cidade na sua vocação de ser o palco do milagre social anunciado pela boca e o rosto negro e contorcido da beata que verteu sangue manchando os lenços brancos que cobriam o cálice do sangue de Cristo.

Lindomar é o seu nome, mas poderia ser João de Deus, Pedro e na perspectiva de gênero, também, pode retratar a situação de Maria, Isabel, Diolinda e tantas outras abandonadas a sorte do destisno cruel na cidade santa que abdicou de cuidar das pessoas, que tem sido negligente no trato com as políticas públicas de reparação socioeconômico, de inclusão social dos setores mais vulneráveis. Uma vulnerabilidade que atinge de cheio a população afrodescendente, negras e negros e a comunidade LGBTQIA+, que compõem parte expressiva da população da cidade da fé. Por outro lado, a população flutuante se mantém por meio do processo de migração constante que remonta desde a origem do lugar aos dias atuais. São características irrefutáveis de um lugar, cuja emancipação foi forjada no sonho de abundancia, no acolhimento e na dignidade dos refugiados do clima em pleno vale do Cariri. Aqui recrudescem as vozes e as crenças dos povos do semiárido.

Atlas Brasil 2013, traz dados importantes em relação as desigualdades sociais, em Juazeiro do Norte, os 20% da população mais pobre detinham 3,73% de toda a riqueza do município, enquanto os 10% mais ricos detinham 44,66% de toda a riqueza. Nos perguntamos se nos últimos 9 anos houve um plano voltado para equilibrar e diminuir tamanha desigualdade. E conforme os dados do Cadastro Único para Programas Sociais do Ministério da Cidadania que aponta no último mês de junho, 104.287 pessoas nas cidades de Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha, sobrevivem com renda per capita de até R$ 89 por mês, o que significa que 33.462 famílias estão em situação de extrema pobreza. Por outro lado, a soma destas famílias em condição de extrema pobreza com as demais famílias com renda de R$ 178 por mês, acumulam mais de 153 mil famílias em situação de vulnerabilidade social no Crajubar.

Combater a pobreza e extrema pobreza requer um esforço integrado com foco nos indicadores, senão haverá apenas discursos e promessas vãs, enquanto isso o capitalismo vai devorando qualquer possibilidade de eliminação das desigualdades.

 

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