• 20 de maio, 2024 03:58

Quando sofri um AVC só havia o SUS para me salvar. Por Waltécio Almeida

ByTarso Araújo

jan 10, 2022

Por Waltécio Almeida, biólogo.

Eu estava no banheiro por volta das duas horas da madrugada. Foi tudo muito rápido, de repente uma escuridão me envolveu. Senti-me como em um mergulho em uma profundidade sem fim de escuridão absoluta. Era como um oceano. Eu não senti dor, nem pensei nada, apenas silêncio total, um sentimento de calma e paz. Não consigo descrever de forma correta, mas arrisco em palavras que era como um desaparecer e ter a sensação de que era para sempre.

O que escrevo agora é o relato do que Débora, minha namorada, contou-me. Ela escutou minha queda no banheiro, gritou, bateu forte em minhas costas até eu abrir os olhos. Ela conseguiu me arrastar, vestir-me e, com a ajuda de Valdo, o porteiro do prédio, colocar-me no carro. Seguimos para o Hospital da Unimed de Juazeiro do Norte, região do Cariri no interior do Ceará. Fui rapidamente atendido e feita uma tomografia craniana. Meus sintomas eram de um Acidente Vascular Cerebral – AVC, mesmo que na tomografia não indicasse se hemorrágico, ou isquêmico.

A médica plantonista da Unimed foi direta: “o único centro especializado para tratamento de AVC por aqui é o Hospital Regional do Cariri – HCR”. É um hospital público estadual e que atende pelo SUS. A médica fez uma carta de encaminhamento, ligou para o HRC e solicitou que Débora assinasse um termo de responsabilidade para me levar de carro. A médica completou, “leve-o mais rápido que puder, se for AVC hemorrágico, em média ele tem duas horas para o tratamento deixar poucas, ou nenhuma sequela, se for AVC isquêmico, a média é de quatro horas”.

Passados 25 minutos estávamos indo em direção ao HRC e ao chegar fui examinado ainda na portaria pelo médico Francisco Yuri Barbosa de Souza, que estava de plantão na Unidade de Tratamento de AVC. Desse momento lembro bem de pedir de forma desarticulada, com metade de minha boca paralisada: “me faz andar de novo, por favor, por favor”. Yuri respondeu com a segurança daqueles profissionais que dominam o que fazem, “você está sendo medicado, vai melhorar”.

Fui prontamente posto em tratamento através de terapia de dupla antiagregação plaquetária e anticoagulação profilática sintomáticos. Do AVC até estar em tratamento passaram-se cerca de 01 hora e 20 minutos. Em 24 horas depois eu voltei a sentir meu lado esquerdo, era um formigamento misturado com dormência e após 48 horas eu consegui ir sozinho ao banheiro, mesmo que ainda mancando um pouco. Foi o suficiente para cair em um choro compulsivo quando liguei o chuveiro.

Eu ainda lembro dos outros pacientes, das vozes, gemidos e das lágrimas. O som intermitente dos monitores multiparâmetros. O correr da equipe de um lado para acertar a sonda de um paciente, ou para o outro lado e reverter uma parada respiratória. Eles não dormem, estão lá, sempre em alerta. Eu não sei que força os move, mas é a maior que humanos podem ter.

No quinto dia tive a oportunidade de ver e ouvir as enfermeiras conversando sobre a luta pela aprovação do piso salarial que tramita em Brasília. Dos deputados e lobistas do setor privado que são contra. Por sua vez, os servidores da saúde de Juazeiro do Norte já estavam em negociações por todo ano de 2021 pela (1) implantação do adicional de insalubridade, (2) criação da gratificação de desempenho e (3) jornada de trabalho de 30 horas. Sem respostas, mediante ao impasse, no dia 03 de janeiro deste ano de 2022 os servidores entraram em greve e, neste exato momento permanecem em luta por seus direitos.

Os servidores municipais da saúde de Juazeiro do Norte, esses homens e mulheres extraordinárias, foi pela atuação deles que hoje eu estou bem e espero que os outros que estavam internados ao meu lado também estejam de volta a suas casas e famílias. Nós devemos isso aos servidores públicos da saúde, ao SUS. Agora é hora de retribuirmos, vamos unir nossas vozes e lutar ao lado deles pelo piso salarial dos enfermeiros e pelos direitos dos servidores públicos da saúde e pelo. Sempre é bom o pleonasmo, mais ainda quando gritamos pela vida: VIVA O SUS!!!

 

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